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Casos de assédio na UFRGS podem ganhar protocolo de conduta

Minuta redigida pelo Núcleo Ampare aponta caminhos para enfrentar problemática

A preocupação em ampliar o debate e apontar caminhos institucionais para a prevenção e enfrentamento ao assédio em suas mais variadas formas no cotidiano da UFRGS motivou a criação, no final de 2021, do Núcleo Assédio Moral, Projeto de Acompanhamento e Reparação (Ampare). Atualmente, o coletivo conta com mais de 20 integrantes, entre professores, técnicos administrativos e estudantes, sendo vinculado ao Departamento de Educação e Desenvolvimento Social (DEDS) e à Pró-Reitoria de Extensão.

Passados apenas seis meses desde sua criação, o Núcleo já vislumbra a colheita dos primeiros frutos. No momento, aguarda pela avaliação de uma minuta de resolução que tem como objetivo normatizar questões associadas à problemática, criando uma espécie de protocolo de conduta. A proposta foi protocolada no dia 17 de dezembro, tendo sido aprovada com mais de 85% de votos pelo Conselho Universitário (Consun). Agora, o documento se encontra na instância legislativa da UFRGS para análise.

“Tudo leva a crer que a resolução será aprovada, claro, com ajustes”, avalia Paula Mastroberti, professora do Departamento de Artes Visuais do Instituto de Artes e coordenadora do Ampare, em entrevista à ATENS UFRGS.

Ela ressalta que o Tribunal de Contas da União (TCU) fez um extenso relatório sobre a necessidade de existência de normas ou de políticas de enfrentamento ao assédio nos órgãos e instituições públicas, e indicou que vai verificar a possibilidade de inclusão, em todas as suas auditorias em andamento, de avaliação dos mecanismos do órgão, no sentido do combate ao assédio em suas diversas formas.

Paula revela que, ao longo das discussões ocorridas até se chegar à minuta final, o grupo diagnosticou e esclareceu diversos pontos, como apontar a definição dos vários tipos de assédio, bem como comportamentos que podem ser considerados assediadores, além de listar artigos que possam apoiar o enfrentamento às perseguições e como encaminhar as denúncias. A Ouvidoria da UFRGS seria o ponto principal para as notificações, pois não caberá ao Núcleo receber denúncias ou encaminhar processos.

“A resolução que apresentamos não prevê uma punição, mas uma reparação para a vítima, dando visibilidade aos casos, ao mesmo tempo em que busca recuperar o assediador. Nos baseamos em três pressupostos: a Justiça Restaurativa, o movimento Cultura de Paz e a Comunicação Não-Violenta”, enumera Paula.

Ela explica que o assediador também pode ser uma vítima do sistema socioeconômico atual, onde é exigida uma produção constante, gerando competividade, stress, sistemas meritocráticos, incentivando o comportamento abusivo. “Claro que o assediado é muito mais vítima, é o sacrificado, mas o assediador também pode ser uma”, diz a coordenadora.

Os próximos passos não param na entrega da minuta. Na última semana de setembro, o Núcleo fará uma capacitação aberta durante a Semana Acadêmica da UFRGS. Paula destaca que a condução do Núcleo ocorre de forma paritária, tendo como coordenador adjunto o psicólogo e técnico de nível superior (TNS) Willian Mella Girotto, do Departamento de Atenção à Saúde/SUGESP.

Para ela, boa parte da criação do Núcleo AMPARE é derivada das possibilidades dos encontros online: “Acredito que, se fosse presencial, talvez não teríamos conseguindo uma coesão, em termos de participação, de tantos servidores. Pensando nos aspectos positivos que a pandemia trouxe, acredito que foi a descoberta de podermos reunir um grupo tão diverso, de locais tão diferentes em torno de uma ideia comum, que é o enfrentamento do assédio no seu mais amplo sentido. Conseguimos reunir mais de 40 pessoas em alguns encontros”.

Apesar desse ponto positivo da virtualidade, surge entre o Ampare uma nova preocupação, desta vez com o sistema de atuação remota e possíveis casos de assédio relativos à sobrecarga de trabalho, sendo necessário passar a debater os limites a serem estabelecidos em relação ao assunto.

Como tudo começou

O Núcleo surgiu a partir de uma capacitação ocorrida entre março e novembro de 2021, dentro de um projeto de extensão realizado em parceria com outros programas á existentes dentro da universidade, como o HeForShe e o Parents in Science. A coordenação ficou a cargo de Jeniffer Alves Cuty, professora no Departamento de Ciências da Informação da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico/UFRGS). Um dos objetivos da capacitação era produzir uma minuta de enfrentamento ao assédio.

Uma pesquisa realizada em 2019 pelo comitê HeForShe da UFRGS, em parceria com o projeto Meninas na Ciência, apontou que somente cerca de 10% dos casos de assédio na instituição são devidamente reportados.

O levantamento tratou da percepção de assédio moral e sexual e contou com participação de 25% dos docentes da UFRGS, 20% dos técnicos administrativos e 12,5% dos estudantes, totalizando cerca de 6 mil respondentes espontâneos. Os resultados indicaram que as vítimas mais comuns são mulheres pretas ou pardas e o público autodeclarado LGBTQIA+.


Anahi Fros | Comunicação ATENS UFRGS

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